“Sei de gente que conta sua vida pelas casas em que morou, ou pelos filhos, empregos e até mesmo pelos carros.”
Rosa Montero
Quando esta coluna começou eu não sabia muito bem o que seria dela. Falar de livros, de como os livros nos movem, de como encontrar respostas nos livros, de como crescer lendo e como sermos melhores após uma leitura. Afinal por que ler, por que escrever? Foram algumas das inquietações que serviram de gatilho e deram origem aos textos escritos e publicados até aqui, neste espaço.
Minha relação com os livros deixou de ser particular e introspectiva após um livro em especial, A louca da casa, da jornalista espanhola Rosa Montero. Classificado como romance, este é um livro que traz um relato autobiográfico, tem um tom de ensaio, pois é cheio de citações e referências a outros autores, tem ficção, já que a própria autora revela que trocou nomes e lugares para preservar algumas identidades e, por fim, acaba assumindo as facetas narrativas de uma longa e divertida crônica.

A partir da sua relação com a irmã, a autora percebeu que seria escritora. Enquanto aquela sempre foi uma fazedora, alguém que cumpria suas tarefas com disciplina e competência, ela, a autora, sempre foi mais dada aos devaneios, à observação e dominada pela imaginação, a louca da casa.
No meio deste encontro, eu percebi o poder de uma leitura que se compartilha. Trata-se de um livro que eu ganhei numa doação de quem se desfazia de uma biblioteca e sabia do meu amor pelos livros. Um livro que eu não teria comprado, um livro que contava a história de como uma mulher se rendeu à escrita e como sua irmã fazedora foi um parâmetro para ela alcançar seu objetivo. Um dos muitos livros que me ajudam a lembrar da minha própria vida.
Um livro carrega ideias, experiências, lições, sonhos, possibilidades, mas pode ser também uma ferramenta de fazer amigos quando percebemos que ele não precisa ficar só com a gente. Alguém que se sensibilizou pela mesma história que nós, pode ter muito mais em comum do que supomos, desde que a gente se permita contar como se sentiu após uma leitura. Um livro é também um instrumento de encontro.
Numa viagem à Paris, a cantora e escritora Patti Smith foi convidada para conhecer a que tinha sido a casa de Albert Camus. Lá, ela foi surpreendida pela filha do autor que lhe ofereceu a oportunidade de ler o manuscrito deixado pelo pai, da obra em que ele estava trabalhando antes de morrer num trágico acidente de automóvel.
Ao debruçar-se sobre o material, comovida, Patti sentiu um forte impulso e no caminho de volta para casa sacou de um toco de lápis que carregava no bolso decidida a se responder: Por que escrevemos? E assim nasceu seu livro Devoção, uma obra que contrapõe ler e escrever e mostra como tais ações são muito mais um diálogo do que um monólogo.

Quem escreve espera ser lido, quem lê sente o impulso de escrever, e para escrever é preciso ampliar o repertório, o vocabulário, o conhecimento, coisas que se conseguem lendo, num ciclo que só se expande, como os círculos concêntricos que se formam após uma pedra ser lançada na água.
Assim, ler e escrever também são um fazer, são ações que demandam movimentação, e este exercício permite angariar muito mais do que palavras, mas também amigos. Chegar até aqui só foi possível porque eu e Leandro (criador do projeto Olhar para Dentro) lemos juntos, nos lemos e conversamos sobre outros livros, um círculo que agora se encerra, mas que, certamente, seguirá reverberando.
Este é meu último texto para o Olhar para Dentro, é minha última contribuição e apelo para que leiam, escrevam e conversem sobre suas leituras e se permitam, com isso, expandir a própria existência.
Autora

Monique Bonomini é de Poá/SP e tem graduação em Direito e História.
Atua como revisora e leitora crítica e dedica-se ao estudo do feminismo. Apaixonada por livros, mantém sua página no Instagram com impressões de leitura.
No Medium publica outros textos autorais. Publicou um desafio no livro Vida de Escritor, lançado pela Lura Editorial em 2021 e tem um conto na coletânea Um conto de tudo, lançado em 2022 pela Têmpora Criativa.
Nas redes: @moniquebonomini
Site: linktr.ee/moniquebonomini
Minha eterna gratidão pelo espaço. Vida longa e sucesso ao Olhar para Dentro. Seguimos parceiros!
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Muito sucesso por onde caminhar que você merece!! Estamos juntos!
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